AGRAVO DE INSTRUMENTO n.º 54.538/2014 - SÃO LUÍS.
(Número único: 0005189-18.2014.8.10.0000).
AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE SÃO LUÍS.
PROCURADOR (A): AIRTON JOSÉ TAJRA FEITOSA.
AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO.
PROMOTOR (A) (ES): LÍTIA TERESA COSTA CAVALCANTI E OUTROS.
RELATORA: DESA. MARIA DAS GRAÇAS DE CASTRO DUARTE MENDES.
DECISÃO
......
"Analisando a documentação trazida nestes autos, verifico que o Município
Agravante vem concentrando esforços para o cumprimento do Termo de Ajustamento
de Conduta - TAC, tendo em vista que já contratou empresa especializada no
assessoramento técnico em todas as fases do processo de licitação da concessão
de serviço público de transporte coletivo, conforme fls. 137/141.
Vejo ainda que já foi realizada audiência pública atendendo ao disposto
no art. 39, da Lei n.º 8.666/1993 (fls. 145/148), bem como enviado à Câmara
Municipal de São Luís mensagem de Projeto de Lei de autorização de delegação de
serviço de transporte púbico coletivo, consoante se vê mensagem de fls. 163,
datada de 20 de outubro de 2014.
Neste sentido, entendo que a intervenção é medida excessiva e
inconstitucional. Primeiro, o Município Agravante vem cumprindo o compromisso
que celebrou com o Ministério Público. Segundo, a competência para legislar
sobre transporte municipal é exclusiva do Município, conforme os termos do art.
30, inciso V, da CF[1].
Desta forma, o Município Agravante, ao enviar o marco regulatório para a
Câmara Municipal, transfere ao Poder Legislativo a tarefa de decidir sobre o
destino do serviço público de transporte coletivo e cumpre a sua parte no
combatido Termo de Ajustamento de Conduta.
Entendo ainda que a Câmara Municipal tem total conveniência para
apreciar o Projeto de Lei que trata sobre a reformulação do transporte
coletivo, não podendo o Poder Judiciário intervir no processo legislativo ao
ponto de nomear um Interventor, já que o Legislativo é soberano na decisão de
produzir as leis, ou seja, na sua função típica.
Sobre o assunto, cito a doutrina de Carlos Pinto Coelho Motta[2], in
verbis:
"Estabelecido o objeto da Lei 8.987/95 em seus dispositivos
iniciais, o seu âmbito de aplicação permanece, ainda hoje, como um ponto
interpretativo. De plano, no parágrafo único do art. 1º encontra-se
determinação de que os entes políticos (Estados, Municípios) promovam a revisão
e as adaptações de seus textos normativos próprios, tendo em vista o
atendimento das prescrições nela fixadas.
Em linha operacional e de realidade, configurou-se boa oportunidade de
modernização normativa, tanto das leis estaduais como das Leis Orgânicas
municipais. Como ponto discutível relacionado ao âmbito de aplicação da Lei,
cabe a questão da extensão da competência constitucional dos entes políticos
para legislar sobre concessão e permissão.
A nosso ver, cada esfera governamental pode e deve exercer essa
competência. Os Estados têm suporte no art. 25, §§ 1º e 2º, da Constituição
Federal; e os Municípios, no art. 30, incs. I e V, da mesma Carta."
De outro turno, a Intervenção na Secretaria Municipal de Trânsito e
Transporte desafia o art. 35, inciso IV, da CF, já que somente o Tribunal de
Justiça pode decretar a intervenção no Município através de representação do
Procurador-Geral de Justiça, senão vejamos o que diz o citado dispositivo:
Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos
Municípios localizados em Território Federal, exceto quando:
(...)
IV - o Tribunal de Justiça der provimento a representação para assegurar
a observância de princípios indicados na Constituição Estadual, ou para prover
a execução de lei, de ordem ou de decisão judicial.
Portanto, sem exame ainda da probidade do interventor nomeado pela
Justiça, a decisão afronta as regras constitucionais para o caso descumprimento
de ordem judicial.
O regime democrático que vivemos não permite a intervenção pura e
simples de um Poder sobre o Outro, principalmente do Poder Judiciário, o qual
deve respeitar os princípios e regras constitucionais.
Sobre o assunto, este Egrégio Tribunal de Justiça já se pronunciou, in
verbis:
REPRESENTAÇÃO PARA INTERVENÇÃO ESTADUAL EM MUNICÍPIO. DESCUMPRIMENTO DE
DECISÃO JUDICIAL. COMPROVAÇÃO POSTERIOR. PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DOS ENTES
FEDERADOS. INTERVENÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. REPRESENTAÇÃO IMPROCEDENTE. I. O
Estado Federal, fundamentado no princípio da autonomia política das entidades
que o compõem, caracteriza-se pela existência de um governo próprio, com
competências constitucionais exclusivas, como preceitua o art. 18 da
Constituição Federal de 1988. Entretanto, a Lei Maior admite, em rol taxativo,
o extraordinário afastamento dessa autonomia, por meio da intervenção de uma
entidade política sobre outra, face ao interesse maior de preservação de
unidade da Federação. II. Comprovando-se nos autos o cumprimento, ainda que
tardio, de decisão judicial que determinara a inclusão, na lei orçamentária
local, de recursos necessários à realização de programas de acolhimento, com
atendimento individualizado, além do oferecimento de abrigo para crianças e
adolescentes, mostra-se inadequada a intervenção, ante a excepcionalidade da
medida. III. Representação improcedente.TJMA. Acórdão n.º 141.194/2014. Rel.
Des. Vicente de Paula Gomes de Castro. Data do julgamento: 05.02.2014.
Portanto, entendo que estão
presentes os requisitos para concessão do efeito suspensivo, principalmente o fumus
boni juris, posto que o periculum in mora é sensível na medida em que
a qualquer momento as autoridades municipais estarão privadas de exercer as
suas atividades cotidianas".